Como ajudar crianças e adolescentes com dificuldades do desenvolvimento a enfrentar o confinamento durante a pandemia de COVID-19?
Desde o início da quarentena, as crianças foram submetidas a mudanças bruscas e importantes em suas rotinas. A súbita interrupção das atividades nas escolas, terapias, prática de esportes e lazer produziu grande impacto emocional.
Ademais, os pais estão diante do enorme desafio de trabalhar em home office, cuidar da casa sem qualquer tipo de apoio e manejar as tarefas acadêmicas e aulas online enviadas pelas escolas no contexto de incertezas econômicas, sociais e psíquicas inéditas.
A situação atual repercute ainda mais nas crianças com problemas do desenvolvimento, por exemplo, aquelas com transtorno do espectro autista (TEA) ou transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH).
É natural que os pais, familiares e cuidadores tenham questionamentos, e o objetivo deste texto é ajudá-los a esclarecer tais dúvidas e atravessar esse período conturbado de maneira menos aflitiva possível.
Como distrair meu filho(a) em casa e ajudá-lo(a) a passar o tempo?
O período de quarentena possibilita maior contato familiar e para tal, há a necessidade de realizar e incluir atividades que conciliem o tempo e as necessidades da criança.
Todos sabem que as brincadeiras estimulam a curiosidade e a criatividade das crianças, desde um simples quebra-cabeça ou desenhos livres até um jogo de “esconde-esconde” ou atividades manuais.
Elas não “substituem” as terapias inseridas em um programa de reabilitação, mas têm a excelente qualidade de reunir a criança e seus pais ou cuidadores numa atividade lúdica.
De modo semelhante, definir objetivos diários alcançáveis e manter a rotina de alimentação são essenciais, a fim de evitar o aumento de ansiedade e estresse.
Uma boa opção é sempre procurar oportunidades para interagir com outras crianças, principalmente as que fazem parte da rotina delas, seja por meio de vídeos, ligações ou jogos online.
Uma estratégia interessante em momentos de crise, quando a maioria das pessoas sente que as soluções estão fora do seu controle, é oferecer escolhas que visam a aumentar o sentimento de autonomia e motivação.
Algumas opções são escolher uma nova rota de caminhada segura, um jogo ou um programa de TV para ser assistido em família, ou leitura conjunta de história e livros apropriados.
Devo criar novas regras e/ou limites para as crianças dentro de casa?
Uma das regras de ouro da educação infantil é cultivar um ambiente onde haja regras claras e constantes. Porém, nas circunstâncias atuais, a criança deve aprender a conviver com mudanças na sua rotina.
Utilizar fotos, desenhos ou imagens que demonstrem objetivos a serem atingidos ou anunciem as atividades daquele dia é uma excelente atitude. Alguns exemplos dessa intervenção: fotos mostrando a escova de dente, uma criança tomando banho, uma família durante uma refeição, e assim por diante.
Estimular a criança a atingir tais objetivos colocando-os na sequência devida facilita o seu engajamento. Não podemos nos esquecer de parabenizar a cada realização bem-sucedida, caracterizando um reforço positivo.
A criação de novas rotinas também é fundamental, mas muitas vezes difícil em razão da rigidez comportamental que muitas crianças com TEA apresentam. Nossa sugestão é tentar uma transição gradual, com regras claras, consistentes e concretas.
Cuidado especial com a tendência ao abuso de telas na quarentena. Você deve planejar previamente o tempo de tela na programação diária, e o uso de um temporizador visual facilita bastante o controle do tempo pela própria criança. O uso de contagem regressiva visual também ajuda a criança a “enxergar” quanto tempo lhe resta.
Outra dica é planejar o tempo de tela antes das atividades preferidas, pois desligar os dispositivos antes de um lanche será mais fácil do que antes de uma atividade acadêmica.
Uma dificuldade comum é a transferência das estratégias usadas na escola para o ambiente doméstico, como o envio de tarefas online e a organização dos materiais. A sugestão é criar um ambiente “escolar”, com poucas distrações, e que inclua uma lista visual das tarefas a cumprir em determinada sequência.
O que fazer quando meu filho(a) não quiser mais ficar em casa?
O momento atual é de fato difícil e único. Haverá situações em que a criança se mostrará descontente com o ambiente domiciliar, podendo até apresentar alterações do comportamento.
Diante desse impasse, sugerimos aguardar horários mais tranquilos, com pouco movimento, para sair ao ar livre, caminhar e distrair-se, porém, nunca se esquecendo das normas de segurança.
O que fazer para não prejudicar os ganhos que meu filho(a) teve nas terapias até o momento?
Apesar de ser impossível manter a terapia ocupacional, fonoterapia, psicoterapia, entre outras, com a mesma intensidade, sugerimos que as crianças e os pais permaneçam em contato com os terapeutas, a fim de que estes possam auxiliar com dicas de tarefas domiciliares e até mesmo sessões online.
É fundamental lembrar que não devemos esperar respostas imediatas com a mudança das rotinas. Se essas mudanças são difíceis para nós adultos, imagine para as crianças.
Outro aspecto importante é que muitas crianças experimentam períodos de regressão do desenvolvimento ou recrudescimento de sintomas que já estavam superados ou bem reduzidos.
É possível que tais períodos sejam mais intensos durante a quarentena, mas tenhamos em mente que a recuperação das habilidades costuma ocorrer do mesmo modo, em outras palavras, é mais fácil percorrer um caminho já conhecido.
Como devo proceder em casos de urgência ou dúvidas em relação às medicações?
Caso ocorra alguma urgência/emergência de saúde, tente contato com seu médico; do contrário, procure uma Unidade Básica de Saúde (UBS), Unidade de Pronto–Atendimento (UPA) ou o hospital mais próximo. Não tome decisões isoladas sobre os medicamentos, como alterar ou suspender doses.